Existe tributação nas pequenas compras em plataformas internacionais?

Micaela Dominguez Dutra

Com a globalização houve um estreitamento de laços comerciais e afetivos. Hoje tudo circula de modo muito mais fácil, graças a tecnologia, e, sem dúvida, a pandemia estreitou de modo ainda mais intenso esses laços, facilitando quebra de objeções com relação a compras pela internet, inclusive as que se efetuam por meio plataformas internacionais, que ofertam produtos de toda espécie por preços altamente competitivos.

Todas as compras internacionais efetuadas em plataformas como Shein, Urbanic, Shoppe, AliExpress, dentre outras, são feitas por pessoas físicas e tem baixo valor, por isso, tendem a não serem tributadas. Essa isenção tributária é conhecida como de minimis, que estabelece um teto mínimo com o fito de não onerar pequenas importações, bem como não onerar mais a fiscalização com o que é pouco relevante.

O Decreto-Lei nº 1.804/1980 dispõe sobre a tributação simplificada em caso de remessa postal internacional, deixando claro que o limite máximo para a isenção dos tributos incidentes na importação sob esse regime é de US$ 100, desde que destinados a pessoas físicas. Não pode haver intuito comercial para se beneficiar do regime simplificado.

Contudo a Portaria MF nº 156/1999 visando regulamentar o DL nº 1.804/1980, trouxe algumas restrições e especificações, que são:

  1. o regime de tributação simplificada poderá ser utilizado no despacho aduaneiro de importação de bens integrantes de remessa postal ou de encomenda aérea internacional no valor de até US$ 3,000.00 (três mil dólares dos Estados Unidos da América), mediante o pagamento do Imposto de Importação calculado com a aplicação da alíquota de 60%, independentemente da classificação tarifária dos bens que compõem a remessa ou encomenda;
  2. Reduz a 0% a alíquota incidente sobre os produtos acabados pertencentes às classes de medicamentos no valor limite de até US$ 10.000,00 (dez mil dólares dos Estados Unidos da América), por pessoa física, para uso próprio ou individual, desde que atendidos os requisitos estabelecidos pelos órgãos reguladores específicos;
  3. Altera o teto base para a isenção, reduzindo de US$ 100 para US$ 50, e condiciona que para usufruir da referida isenção devem ser pessoas físicas tanto o remetente quanto o destinatário. Importante destacar que essa isenção abrange: IPI, PIS-importação, Cofins-importação, contudo não impede a cobrança de taxa específica dos Correios sobre as remessas;
  4. Exclui do regime simplificado a importação de diversos produtos: animais vivos, bebidas alcoólicas, substâncias químicas específicas, produtos à base de tabaco e armas.

 

Importante ressaltar que a Portaria define no art. 2 que para fins do regime simplificado é utilizado como base o valor aduaneiro da totalidade dos bens que integrem a remessa postal ou encomenda área internacional, sendo esse o preço de aquisição, acrescido:

  • da importância a ser paga pelo destinatário da remessa postal ou encomenda aérea internacional, conforme o caso: à ECT; à companhia aérea responsável pelo transporte da encomenda até o aeroporto alfandegado ou descarga; ou à empresa prestadora de serviço de transporte expresso internacional e de entrega no local de destino no País, quando se tratar de encomenda expressa;
  • do valor do seguro a ser pago pelo destinatário relativo ao transporte e entrega

 

Um ponto que enseja dúvida é se a isenção é de US$ 50 ou US$ 100, já que DL e Portaria divergem nesse ponto, bem como se realmente para ser aplicada é necessário que remetente e destinatário sejam pessoas físicas.

A RFB defende as restrições trazidas na portaria: teto de US$ 50 e a necessidade de remetente e destinatário serem pessoas físicas. Havendo manifestação expressa nesse sentido na Nota Técnica Sutri/Suari, divulgada em 12/02/2014.

Contudo essa divergência de limites para o teto da isenção foi judicializada por contribuintes, que defendiam ter a Portaria extrapolado os limites legais. Apesar de alguns terem logrado êxito, essa questão chegou ao STJ, onde foi reconhecida a legalidade da Portaria pela Segunda Turma, ao julgar o RESP nº 1736335 / SC, rel. Min. Mauro Campbell, DJe 26.02.2019:

2. A isenção disposta no art. 2º, II, do Decreto-lei n. 1.804/80, se trata de uma faculdade concedida ao Ministério da Fazenda que pode ou não ser exercida, desde que limitada ao valor máximo da remessa de US$ 100 (cem dólares americanos – uso da preposição “até”) e que a destinação do bem seja para pessoa física (pessoa jurídica não pode gozar da isenção). Essas regras, associadas ao comando geral que permite ao Ministério da Fazenda estabelecer os requisitos e condições para a aplicação da alíquotas (art. 1º, §4º, do Decreto-lei n. 1.804/80), permitem concluir que o valor máximo da remessa para o gozo da isenção o pode ser fixado em patamar inferior ao teto de US$ 100 (cem dólares americanos), v.g. US$ 50 (ciquenta dólares norte-americanos), e que podem ser criadas outras condições não vedadas (desde que razoáveis) para o gozo da isenção como, por exemplo, a condição de que sejam remetidas por pessoas físicas.

3. Nessa linha é que foi publicada a Portaria MF n. 156, de 24 de junho de 1999, onde o Ministério da Fazenda, no uso da competência que lhe foi atribuída, estabeleceu a isenção do Imposto de Importação para os bens que integrem remessa postal internacional no valor de até US$ 50 (cinquenta dólares dos Estados Unidos da América), desde que o remetente e o destinatário sejam pessoas físicas.

4. O art. 2º, §2º, da Instrução Normativa SRF n. 96, de 4 de agosto de 1999, ao estabelecer que “os bens que integrem remessa postal internacional de valor não superior a US$ 50.00 (cinqüenta dólares dos Estados Unidos da América) serão desembaraçados com isenção do Imposto de Importação, desde que o remetente e o destinatário sejam pessoas físicas” apenas repetiu o comando descrito no art. 1º, §2º, da Portaria MF n. 156/99, que já estava autorizado pelo art. 1º, §4º e pelo art. 2º, II, ambos do Decreto-lei n. 1.804/80.

Dessa forma, o teto hoje para a isenção é de US$ 50, já a exigência de remetente e destinatário serem pessoas físicas, muitas vezes é flexibilizada na prática, sendo relevante a ausência de intuito comercial na compra, com a caracterização de que a importação envolve material para consumo.

Existe Projeto de Lei com vistas a alterar esse regime simplificado, que é o PL 2339/22 o qual prevê o recolhimento do Imposto de Importação (II) sempre que se tratar de remessa postal internacional decorrente de vendas de mercadorias estrangeiras pela internet e demais meios eletrônicos.

De todo modo, hoje, é importante que você faça as contas, pois se o seu produto exceder os US$ 50, será objeto de tributação. E como isso acontece?

O produto chega ao Brasil, na alfandega brasileira, ele vai passar pelo processo de fiscalização, onde se verifica o produto, origem, valor. Verificado que a encomenda tem valor acima da isenção de US$ 50 (produto + frete + seguro), realiza-se o cálculo do II, cuja alíquota é de 60%. O câmbio a ser usado é o do dia do lançamento. Se a importação se der pelos Correios, é possível acompanhar o trânsito e pagar os tributos por meio da página Minhas Importações, existente no site.

Vale salientar que os Correios costumam mandar uma carta para o endereço do importador informando da necessidade de realizar o pagamento dos tributos sobre a encomenda.

Então, antes de se animar muito nas compras feitas em plataformas internacionais, você precisa fazer as contas, afinal, em regra, esse tipo de operação não estaria resguardado pela isenção cujo teto é US$ 50, já que exige que remetente e destinatário sejam pessoas físicas, o que obrigaria você a pagar imposto de 60% independente de seu valor. Por isso é relevante que veja se o valor pago na compra mais a tributação compensa ou se é melhor deixar para comprar produto similar no Brasil.

Viu como a tributação pode influenciar até nas suas escolhas de consumo?

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